6.5.08

MOSTRA DE INSTRUMENTOS ANTIGOS NO SESC- A HISTÓRIA DO VIOLÃO - DA LUZ AO OCASO

Amigos!
Acabo de chegar do SESC na sua unidade do centro de Porto Alegre (Av. Alberto Bins, 665). A convite do SESC fui ver uma exposição chamada "A História do Violão". Uma belíssima exposição com réplicas de instrumentos muito antigos como "vihuella", Viola renascentista, alaúde (uma série deles!!!). Tudo com muito cuidado e capricho.
Contudo, voltei para casa muito dividido em meus sentimentos. Se por um lado o êxtase dos olhos e do espírito ao ver de perto instrumentos históricos, por outro, umprofundo incômodo e até, porque não dizer, frustração quanto ao que eu ouvi na palestra de abertura da exposição. Foi ministrada por um senhor que me foi passado como informação por um funcionário do SESC como o construtor das réplicas ali expostas - notem que não o chamei de "Luthier" ou "Artesão", nem tão pouco o chamarei assim a posteriore.
Explico.
A explanação ia muitíssimo bem sobre a história dos instrumentos, as orígens dos alaúdes, suas ordens de cordas, etc. Até que esbarrou-se na viola de 10 cordas!

PRIMEIRO DESLIZE.
O senhor explicou a ramificação originária da viola, sua entrada em nosso país e tudo mais, porém, não pude deixar de notar que em dado momento de sua colocação ele deixa claro que esta não teria muito seu "cultivo" aqui no sul, o que em parte se traduz em realidade, mas em parte pois não podemos esquecer dos portugueses açorianos que até hoje em sua cultura litorânea (ternos de reis) são presentes. Pois bem, este senhor AFIRMOU não existir experessões com este instrumento aqui no Rio Grande do Sul! Bom!!!Aí eu já fiquei meio incomodado e desconfiado...seguiu-se a palestra...

SEGUNDO DESLIZE.
Ao final, após a explicação sobre a célebre construção de "Torres", luthier que modelou o violão até os dias de hoje, abriu-se o espaço para apartes e perguntas.
Diante da mudez inicial dos poucos participantes, de pronto perguntei:
-Senhor, e o alaúde árabe? Podería o senhor nos dizer algo?
Bem, ele colocou básicamente que o alaúde árabe mantém até hoje a mesma estrutura como instrumento, sem trastes, tocado com plectro e com sonoridade igual aos antigos alaúdes árabes do século IX.
Até aí, tudo bem! No entanto, este senhor comete, em minha opinião, um segundo deslize - quase equívoco! Se isso pode existir!
Coloca ele:
"-... ao passo que o alaúde árabe continua até os dias de hoje com a mesma sonoridade e estrutura, o alaúde europeu se desenvolveu,tomou várias configurações até tornar-se o célebre alaúde da Renascença francesa..."
Não pude deixar de notar o que estava por trás deste "evolucionismo". Mais uma vez se faz coro e endosso àqueles "equívocos-crime" que consideram a cultura européia como que sendo "superior" às demais. Relegando por exemplo as culturas árabe, hindu, japonesa, indígena ou africana como "exóticas" ou "tribais" como pano de fundo de seus discursos.

A CEREJA DO BOLO.
Esta se dá quando por fim, eu o indago:
- E a viola de cocho, senhor? Aquele instrumento pantaneiro...
Ele diz conhecer o instrumento, e explana:
-É um instrumento pobre!!!Nem se sabe de onde veio!! Imaginem só, um instrumento de 3, 4 ou 5 cordas e com apenas 2 ou 3 trastes!!?
-Que música dá pra se fazer com isto???!!
Bom amigos! Eu engoli em seco. Parei. Respirei. Agradeci e... fiquei puto!
Não entrei em polêmica pois entendi que ali não seria o local nem o momento adequado para tanto. E, em respeito aos cabelos brancos do equivocado construtor de réplicas de instrumentos (volto a reiterar: maravilhosas!) calei!
Mas saí de lá sabendo que, por exemplo:
O Romário jogava para caramba, foi um dos maoires gênios da grande área mas, convenhamos, alguém o imagina discorrendo sobre política ou filosofia? Nem ele tão pouco!
Então!?
Não precisamos ser neófitos para estarmos e sermos equivocados!
Gostaria de sugerir ao SESC maior sensibilidade na curadoria em eventos deste porte e que os
construtores de instrumentos restringissem-setão somente aos aspectos técnicos estruturais na construção dos instrumentos ou a alguns fatos históricos para a contextualização dos mesmos. Deixem os pesquisadores sérios explanarem. Existem tantos e tão bons!! Marlene Goidanisch para instrumentos antigos, Paulo Freire e Roberto Corrêa para viola de 10 cordas, Alcides Ribeiro de Carvalho para viola de cocho, Daniel Wolf para violão e tantos outros!!!
Não deixem que a impressão pessoal tão somente adquira status de pesquisa.
A propósito, esta - a impressão pessoal - foi a salvação da fatídica explanação. Disse aquele senhor encerrando a palestra:
-Então senhores, esta foi uma breve colocação sobre A MINHA história do violão!

E eu concluo:
Santa ignorância a dos santos!!!
Pois só sendo ignorante ou um santo para conseguir aguentar tanto descaso ou desconhecimento sobre os instrumentos e manifestações genuínamente brasileiras, ainda que não seja o foco da palestra, um pouco de detalhe e respeito, fazem diferença.

Em tempo:
A maravilhosa exposição continuará em horário comercial no SESC do Centro (Av.Alberto Bins 665 das 9h-12h e das13h-20h até o dia 10/05)
Talvez a viola de cocho tocasse uma música incompreensível aos ouvidos de alguns, mas esta vem docemente embalada pelo beneplácito camuflante da simplicidade!
Abraço à todos!
"Não confio em ninguém com 32 dentes!"

2 comentários:

Escritora Tânia Barros disse...

Muiito bem! Gostei do relato e da indignação!

Abraço

artesdeaffonso disse...

parabéns!!!excelente!!!